Enquadramento histórico-cultural:
Os finais do século XIX e
início do século XX ficaram marcados pela abolição da censura a livros e a
periódicos e pela proclamação da liberdade da imprensa.
Consequentemente, o número
de publicações multiplicou-se, detendo Portugal, no início de novecentos, um
lugar de relevo entre os países do mundo, quer no que à taxa proporcional de
periódicos diz respeito, quer mesmo ao seu número absoluto.
Os jornais e as revistas
desse tempo revelam uma elegância de escrita e uma qualidade de estilo que
impressiona até nos dias de hoje.
Enquadramento
histórico-político:
Deposta a monarquia e
proclamada a República, em 5 de Outubro de 1910, foi das mãos do Partido
Republicano que surgiu o Governo Provisório, presidido por Teófilo Braga (cujos
verdadeiros chefes eram António José de Almeida, Afonso Costa, Bernardino
Machado e, mais tarde, Brito Camacho) e nasceu a Assembleia Nacional
Constituinte.
Às eleições legislativas de
Maio de 1911 quase só concorreram candidatos do Partido Republicano.
Todavia, as divergências no
Governo, rapidamente conduziram à cisão do Partido Republicano.
Assim, entre Setembro de
1911 e Fevereiro de 1912, lançaram-se as bases dos três primeiros partidos do
republicanismo constitucional: Partido Republicano Português (democráticos), de
Afonso Costa, que permaneceu até ao fim do regime político, Partido Republicano
Evolucionista (evolucionistas), de António José de Almeida, e União Republicana
(unionistas), de Manuel Brito Camacho, tendo estes dois últimos se extinguido
em Setembro de 1919.
Enquadramento regional da
Torre de Dona Chama:
No início do século XX, a
Torre era uma terra de relativa importância no Nordeste Transmontano.
Havia perdido o seu
concelho, em 1855, mas mantinha a condição de segunda terra mais importante do
concelho de Mirandela, assente na sua vasta produção agrícola e de ofícios, os
quais transacionava, com grande pujança, nas suas duas feiras mensais (dos 5 e
dos 17) e nas anuais dos Santos e dos Reis, referenciais no comércio regional,
mormente, no que concerne ao comércio do gado.
Beneficiava do seu
posicionamento geográfico, distando cerca de 25 quilómetros das sedes de
concelho mais próximas, permanecendo como referência local para as terras
circunvizinhas.
Para isso contribuía o facto
de por si passar a estrada que ligava Mirandela a Bragança e possuir uma
estação telégrafo-postal.
Possuía ainda um conjunto de reputadas casas comerciais.
Publicidade do Jornal "A Torre D. Chama" |
Imprensa local:
Do que chegou ao nosso
conhecimento, o 1º jornal local do século XX foi o designado “Torre D. Chama”,
fundado, ao que supomos (não tivemos acesso aos 6 primeiros números) em
Fevereiro de 1911, sendo Antonio D’Assumpção Teixeira, inicialmente, o seu
director, proprietário, administrador e editor.
1ª Página da Edição nº 7 |
A publicação do Jornal
“Torre D. Chama” foi suspensa em 30.06.1911, vindo a retomar-se em 1.02.1913,
com a edição nº 9, mantendo-se Antonio D’Assumpção Teixeira como director e
proprietário, mas passando a ser Manuel Luiz D’Assumpção Teixeira o
administrador e editor.
1ª Página da Edição nº 9 |
Vale a pena rever aqui um
excerto editorial dessa edição:
“Reaparece hoje o nosso
modesto jornal, continuando com a mesma orientação que tinha na epoca, em que,
por certos motivos, suspendeu a sua publicação. O seu reaparecimento não traduz
uma vaidade de quem hoje vem de novo á arena da imprensa. E antes, acima de
tudo, o intento de fazer alguma cousa de útil e de bom em prol da Republica,
que redimiu a nossa Patria, e da terra amada, que nos foi berço, que nos
determinou a terçar armas no campo do jornalismo”.
Assumindo-se, inicialmente, como “Jornal Independente”, na edição nº 14, de 15.04.1913, proclama a sua filiação no Partido Republicano Portuguez, passando a ostentar no seu cabeçalho a designação de “Jornal Democrático”.
1ª Página da Edição nº 14 |
Justificou-se, assim, tal
opção política:
“Terminou com a
independencia que vinha sustentando desde a sua fundação e filiou-se no Partido
Republicano Portuguez, que é o único partido que respeita e segue o velho
programa que sempre norteou os bons republicanos, a nossa “Torre D. Chama”.
Tendencialmente quinzenal
(algumas edições saíram atrasadas), o conteúdo do jornal oscilava entre
questões de teor nacional, fruto da intensa luta política que o país vivia e à
qual nem o nordeste transmontano permanecia indiferente e questões locais,
de defesa da terra, registando ainda uma intensa participação de colaboradores,
residentes noutras localidades, designadamente, no Porto e Bragança.
Relativamente às questões
locais, reconhecidamente, por vezes esquecidas, destacamos os excertos de artigos, da
edição nº 8, de 30.06.1911:
“Muitos amigos e leitores
teem estranhado com palavras de justa censúra misturada de indignação que não
tenhamos dedicado uns momentos de attenção, expressa n’este obscuro semanário,
ao estado de abandono a que inflismente foi votada esta nossa amada terra (…)”.
“(…) esta terra só começou a
conhecer a acção benéfica dos governos, quando esse homem de bem, grande
patriota e eminente estadista Emídio Navarro trabalhou denodadamente, mesmo com
sacrifício na imprensa, no parlamento e no governo pela construcção da estrada
que todos os dias trilhamos e nos liga com Bragança e Mirandella”.
Dizia-se ainda que a apontada beneficiação trouxe
“(…) como consequencia logica, dedusida da nossa
bella situação geográfica, mais dois importantes melhoramentos – uma estação
telegrapho postal e uma corrida com o caminho de ferro, na estação de
Mirandella”.
Referenciava-se ainda que “toda a região” reclama
“A creação d’uma comarca, ou pelo menos de um concelho que era de immensa e indisivel commodidade para nós e povos circunvizinhos, que ficamos, no melhor dos calculos, a 25 kilometros das sedes dos respectivos concelhos(…)”.
1ª Página da Edição nº 8 |
No mesmo artigo da edição nº
8 outros melhoramentos eram reclamados, mormente a conclusão da escola
primária:
“(…) no largo da feira,
mesmo à beirinha da estrada uma casa construída pelo plano Bermudes e não está
concluida por faltarem os trabalhos de trolha e pouco mais, cuja casa disem é
destinada a escola primaria dos dois sexos”.
A esta questão havia de
voltar o Jornal, no seu nº 13, de 1.04.1913:
“Achava conveniente que
muito respeitosamente se representasse ao Ex.mo Ministro do Interior para que
se digne dar por findo o edifício para a instrução primaria, que á oito anos
lhe foi dado começo e que até hoje não se acha dado ás funções a que ia ser
destinado!”
Ainda no mesmo artigo do nº
8, manifestava-se preocupação em relação ao abastecimento de água:
“Fizeram-se promessas,
consumiu-se rethorica e gastaram-se alguns cobres para se dar começo á
canalização d’aguas que muito esta terra carece, mas, sempre o mas, ainda não
foi levada a effeito e sabe Deus quando será”.
Noutro artigo da edição nº
8, intitulado “A’ Junta de Parochia”, escrevia-se:
“Lembramos que era de grande
interesse para esta villa e para as povoações que nos rodeiam, representar ao
Ex.mo Governador Civil, para ver se conseguiam a que as feiras denominadas as
dos Santos e Reis, as mais importantes de todo o anno, tivessem mais um dia – 5
e 6”.
Esta assunto viria a ser
relembrado no nº 9, após o período de suspensão da publicação:
“São decorridos dois anos e
ainda essa representação se não fez! Porquê? Por que não quizeram. Eis
infelizmente a verdadeira razão. (…)
Reuna pois a comissão
parochial e resolva o assunto quanto antes, prestando assim um beneficio á
Torre D. Chama”.
Ficam aqui outras
referências a notícias locais:
Edição nº 11, de 1.03.1913:
Na primeira página é
apresentado o programa da “Festa da Arvore”, “iniciativa altamente patriotica
do «Seculo Agricola», promovendo a «Festa da Arvore», em todas freguesias do
país”.
Edição nº 12, de 15.03.1913:
Na primeira página é publicado um extenso artigo sobre a “Festa da Arvore”, realizada em 9.03.1913, a cuja comissão presidiu o Dr. José Alves Ferreira da Silva, “ilustrado e integro medico municipal desta terra” e da qual foi vogal, o Padre Antonio Moás, “erudito abade desta freguesia”.
1ª Página daEdição nº 12 |
Edição nº 13, de 1.04.1913:
Sobre a vinda da Guarda
Republicana à feira:
“Para assegurar a ordem da
feira do dia 5, vieram para aqui fazer serviço, alguns soldados da Guarda
Republicana. Bom será que continuem a vir por aqui em todas as feiras, para que
as tranzações se efetuem á vontade”.
No mesmo número, anuncia-se
a seguinte nomeação, como Regedor:
“Foi nomeado Regedor desta
vila e tomando posse na semana passada, o nosso amigo sr. João Bernardo. Que
saiba cumprir a missão de que está incumbido, são os nossos desejos”.
Edição nº 15, de 10.05.2013:
Dá-se conta que “Foi a
Lisboa tratar de assuntos políticos, o nosso querido amigo sr. Antonio Bernardo
Teixeira, chefe da estação telegrafo-postal e chefe do partido democratico
desta vila”.
1ª Página da Edição nº 15 |
Sem comentários:
Enviar um comentário