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Muitos
da minha geração concluíram o antigo ciclo preparatório no edifício, sito na
Rua Dr. Bonfim das Neves [WGS84 (graus decimais): lat.:
41.655292º, long.: -7.127487º], que actualmente serve de
instalações à Junta de Freguesia de Torre de Dona Chama e outros serviços
públicos.
Contudo,
tal edifício centenário foi construído para o ensino primário.
Vale
a pena fazer uma breve resenha histórica sobre a sua construção.
O
ensino primário oficial, na Torre de Dona Chama, naturalmente, começou muito antes
da construção deste edifício.
Já
em 9 de Fevereiro de 1832, o Diário do Governo dava conta da abertura de um
concurso para “a Cadeira das Primeiras
Letras da Torre de D. Chama, na Provedoria de Moncorvo, com o Ordenado anual de
90$000 rs.”.
Na
“Colecção dos Relatorios das Visitas
feitas aos Districtos pelos respectivos Governadores Civis em virtude da
Portaria de 1 de Agosto de 1866, 1868, Lisboa: Imprensa Nacional”, em que
se faz um cenário muito negativo da “instrucção
publica” no distrito de Bragança (“pessimas
casas de escolas e mau pessoal”), referencia-se António Bernardo Mendes como professor da escola nocturna para adultos,
a qual, contudo, ainda não se tinha conseguido abrir “pela nenhuma capacidade da casa”.
A
construção da escola primária de Torre de Dona Chama teve início em 1905, fazendo
parte de um conjunto de 184 escolas, cujo concurso público foi lançado em
finais de séc. XIX.
Tal
concurso veio a ser ganho pelo arquitecto Adães Bermudes, com um projecto que viria
a obter a medalha de ouro da Secção Escolar, na Exposição Universal de Paris
1900.
Imagem retirada de osafifinhos.blogspot.com
Tal
projecto tipo era constituído por um corpo central mais elevado, que se
destinava a casa dos professores e duas salas onde se separavam os dois sexos.
Característica
das escolas Adães Bermudes, ausente porém no projecto de Torre de Dona Chama,
era a existência de uma ou mais torre sineira, o que as tornou popularmente
conhecidas como as “escolas dos sininhos”.
A
finalização da construção da escola primária de Torre de Dona Chama foi de
difícil gestação, arrastando-se por vários anos.
Disso
nos dá conta o Jornal “Torre de Dona
Chama” (sobre o qual se pode consultar neste blog “A Imprensa Torreense no Alvor Republicano –
Parte I”), na sua edição de 30.06.1911, referindo que “(…) no largo da feira, mesmo à beirinha da
estrada, uma casa construída pelo plano Bermudes (…) não está concluida por
faltarem os trabalhos de trolha e pouco mais, cuja casa disem é destinada a
escola primaria dos dois sexos”.
E
o impasse mantinha-se em 1913, como é referido na edição de 1.03.1913 do mesmo
Jornal, em que o seu Director “achava
conveniente que muito respeitosamente se representasse ao Ex.mo Ministro do
Interior para que se digne dar por findo o edifício para a instrução primaria,
que á oito anos lhe foi dado começo e que até hoje não se acha dado ás funções
a que ia ser destinado!”.
Já
em 1915, o Jornal “Éco de D. Chama”
(ver neste blog, “A Imprensa Torreense no Alvor Republicano – Parte II”),
no seu nº 1, de 21.03.1915, referia que “existe
nesta vila um edificio escolar em construção. Há mais de seis anos que ali os
trabalhos estão paralisados dando o resultado do referido edificio estar numa
demolição constante em virtude de não estar completamente coberto, nem ter
vidros nas janelas”.
Digitalização
do autor
A
edição do mesmo Jornal, de 18.04.1915, insiste na necessidade de acabamento do
edifício, uma vez que “uma das suas salas
está transformada numa retrete sempre à disposição do vulgo ignorante”.
Desconhece-se
a data em que o edifício ficou construído, sendo que é crível que as
dificuldades da 1ª Grande Guerra (1914-1918) não tenham permitido a sua
conclusão nesse período.
Foto
SIPA
Do
ponto de vista arquitectónico, o edifício da escola primária de Torre de Dona
Chama é de planta rectangular, composta por três volumes escalonados, sendo o
mais alto destinado à residência dos dois professores.
Na
fachada principal, o edifício é rasgado por vãos em arco abatido no piso
inferior, de aduelas calçadas, simples, em tijolo e pedra de fecho em cantaria e rectilíneos no superior, com moldura na verga e parte superior da ombreira em
cantaria de granito, típico da região nortenha, com pedra de fecho saliente.
O
corpo central possui, no piso térreo, duas janelas centrais e duas portas, para
individualizar as dependências dos professores, a que correspondem, no
superior, quatro janelas.
Foto
SIPA
Os
volumes laterais são constituídos por duas salas de aula, antecedidas por
vestíbulos.
Nas
fachadas laterais surgem três lumes escalonados com moldura comum.
Cada uma das
salas de aula possui três amplas janelas em arco abatido, que permitem a
iluminação unilateral daquele espaço de estudo.
Foto
SIPA
Junto
à fachada posterior desenvolve-se amplo pátio, murado, que constituía a zona de
recreio.
A
fachada posterior é composta por corpo central de dois pisos, separados por
friso de cantaria, rasgada no primeiro por duas portas de verga recta,
precedidas de um degrau, ladeando corpo saliente, mais baixo, com cobertura
prolongada lateralmente de modo a criar alpendre sobre as portas; no segundo
piso abrem-se duas janelas iguais às da fachada principal; nas alas laterais,
rasgam-se duas janelas de peitoril, sem moldura e gradeadas e, sob o alpendre,
assente em pilares de cantaria, uma porta de verga recta.
Imagem
retirada do blog contamecomoera.blogspot.com
Muitos
dos nossos antepassados aprenderam neste edifício as primeiras letras,
ensinadas por dedicados professores.
Embora o ensino primário ainda não funcionasse no edifício de que vimos
falando, ficam aqui alguns registos dos professores e alunos que a imprensa
local noticiou, nos inícios do séc. XX:
Em
Março de 1915 era professora do sexo masculino a Sra. Dª Rita Ribeiro Gonçalves (Jornal “Éco de D. Chama”, Edição de 28.03.1915)
e em Maio de 1915, era professora do sexo feminino a Sra. Dª Amélia das Dôres Mendes de Macedo (Jornal
“Éco de D. Chama”, Edição de 23.05.1915).
Em
Julho de 1915 fizeram exame do 1º grau os alunos Genuina da Luz Andrade (bom);
Esperança de Jesus Carvalho (suficiente); Maria Carlota de Sampaio Melo
(suficiente); Maria Inácia Correia (suficiente); Maria Luiza Fernandes
(suficiente); António Joaquim Reimão (bom); Francisco
da Anunciação de Sá (bom); Francisco da Ressureição Lobão (bom); Manoel Joaquim
Peleias (bom) e Luiz António Nogueira (suficiente) – Jornal
“Éco de D. Chama”, Edição de 23.07.1915.
Foto
SIPA
Tendo
servido ao longo dos anos como escola primária, já na segunda metade do séc.
XX, passou a funcionar no edifício o então Ciclo Preparatório (actuais 5º e 6º
anos de escolaridade), tendo aí estudado os nascidos, como eu, na década de 60.
Nessa
data, foi construído um corpo anexo ao edifício originário, no qual funciona,
actualmente, o serviço de correios.
Após
alguns anos de abandono, com a construção de novas escolas, o edifício veio a
ser utilizado, já década de noventa, como Junta de Freguesia e outros serviços
públicos.
Foto
do Autor
Aqui
ficam algumas notas sobre o edifício da escola primária, actual Junta
de Freguesia, com o desejo de que os vindouros o saibam preservar, como
importante e emblemático edifício da Vila de Torre de Dona Chama.
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